Jubileu de Brilhante dos Franciscanos Conventuais Província São Francisco de Assis do Brasil (1949-2024) (Parte 6)

set 17, 2024Assinante, Especial Jubilei de Brilhante, Outubro 2024, Revistas0 Comentários

Neste artigo, continuamos com a entrevista concedida por frei Vitório Valentini, sobre o início da Somiframeco [Sociedade Missionária dos Franciscanos Conventuais], cuja escritura foi lavrada em 9 de dezembro de 1949. Uma ocasião muito especial para nossa Província, que merece ser relembrada e celebrada!

Depois de tomar um gole de água, frei Vitório retomou a narrativa:
“Como se diz popularmente, ‘água mole em pedra dura, tanto bate até que fura’ (gutta cavat lapidem)! Todas as semanas, eu tinha de ir à Cúria de São Paulo para acertar papéis, documentos. Era uma verdadeira empreitada; trajando hábito, eu sentia muito calor, em ônibus ou em trens superlotados. Quando era minha vez – e era quase sempre – após visitar São Francisco de Assis na igreja, ia visitar doutor Francisco Peruche. Um dia, fui até ele e apresentei-lhe os croquis da igreja, arriscando-me a fazer o pedido: ‘Precisamos de mais terreno, de mais lotes’. Pensei que iria cair o prédio ou uma tempestade, mas qual nada! Ele apenas me disse: ‘Vamos ver!’ ‘Ah!’, pensei, ‘mais um ponto na ponte!’ ‘Aceita um cafezinho, frei Vitório?’

Frei Vitório Valentini na construçãodo Seminário Seráfico, arquivo Província São Francisco de Assis do Brasil

Frei Vitório Valentini na construção do Seminário Seráfico, arquivo Província São Francisco de Assis do Brasil

‘Como não?’, foi minha resposta, pensando no café dos bares a cinco centavos e pensando com meus botões: ‘Em casa com frei Marino, o café deve custar dois centavos’. Então, eu não tomava café nos bares. Só em casa: mais barato, embora, às vezes, mais… frio! Mas não importava: era o nosso café!

Em outra visita, doutor Peruche convidou-me para um almoço em sua casa em Santo Amaro, na Rua Rio de Janeiro. A ponte estava reforçada! E lá fui eu, de novo! Às 11 horas, estava diante de um portão enorme, de muro alto, com muito verde. Era uma casa em estilo coríntio, com tapetes, lustres, cachorros… Pensei que estivesse atrasado. Silêncio. Fui conduzido à sala de visitas. Passavam empregados, empregadas: ‘Servido?’ Eu aceitava tudo o que serviam, sem saber se era de origem londrina, chinesa, francesa, russa…! Nunca vi o relógio passar tão devagar como naquele dia. E eu estava com fome. Ao meio-dia e meia, chegou doutor Peruche. Às 13 horas, chegou uma senhora por uma escada toda entapetada, e ela estava toda sorridente… Quando terminou o almoço, voltei para casa esperançoso. A ponte está mais firme do que nunca!

Um telefonema fez-me voltar ao doutor Peruche com o assunto sobre a doação de terrenos, porque ele me dissera que havia conversado com dom Paulo Loureiro (1908-1975) para doar à Cúria mais doze lotes. Tremi nas bases! Isso era tudo o que eu não queria. Por isso, decidi ir até ele de novo para pedir: ‘Por que o senhor não manda fazer uma escritura em nosso nome, sem passar pela Cúria?’ Sua resposta foi imediata: ‘Quem são os senhores? Perante a Lei, os senhores não têm personalidade jurídica. Arrumem toda a documentação, e eu lhes doarei tudo quanto pedirem!’

Santuário Senhor do Bonfim sendoconstruído no Bairro Parque das Nações, em Santo André (SP), arquivo

Santuário Senhor do Bonfim sendo construído no Bairro Parque das Nações, em Santo André (SP), arquivo

Não perdi tempo! Fomos consultar os estatutos dos paulinos, dos jesuítas, dos capuchinhos… Pusemos tudo no ‘liquidificador’ e, assim, surgiu o que foi e será ainda uma estratégia eficiente e suficiente nesse mundo tão complicado, apesar da boa vontade do então ministro da Economia Hélio Beltrão (1916-1997). Fizemos tudo direitinho: presidente, vice-presidente, secretário… Desse modo, poderíamos controlar todas as alavancas do comando. Sempre de acordo com a Lei.

Nove de dezembro de 1949 foi uma data muito especial! No escritório de doutor Peruche, três escreventes do cartório lavraram a ‘Ata da Escritura de Doação’ com todos os pormenores. Estavam presentes o doador e mais duas testemunhas, e o abaixo assinado frei Vitório Valentini. Todo mundo assinou. E, em um gesto solene, doutor Peruche entregou-me a escritura. Com medo de perdê-la, eu a guardei em uma pasta, apertando-a perto do coração. Nessa hora, faltaram-me palavras para expressar toda a minha gratidão! Só consegui dizer: ‘Muito obrigado!’

Então, doutor Peruche perguntou: ‘Frei Vitório! O senhor não vai pagar champanhe e e biscoitos, para festejarmos essa ocasião tão importante?’ Eu lhe respondi: ‘Sim, mas tenho no bolso apenas alguns centavos suficientes para voltar para casa!’ E ele, sorridente, acrescentou: ‘Não se preocupe! Já está tudo pago!’

Voltei para casa. Os frades tinham dito: ‘Frei Vitório, se você conseguir algo, não venha de ônibus, nem de trem. Venha de táxi!’ Mas decidi ir de ônibus. Chegando em casa, coloquei o documento em cima da mesa, diante deles, e falei, em alto e bom som: ‘Está aqui!’ Imaginem a alegria…!”

 

Foto Jubileu 04ladoOut24MSAEscreveu Santo Antônio de Lisboa e Pádua (1195-1231):

“Nós, filhos, devemos pedir algo ao Pai nosso. Mas tudo aquilo que existe é nada a não ser amar a Deus! Devemos, portanto, pedir amar a Deus, sustentando-o em seus membros mais frágeis e enfermos, alimentá-Lo nos pobres e enfermos, e nos necessitados. Pois bem! Se pedirmos amor, o próprio Pai, que é Amor, nos dará aquilo que ele é: amor!”1

 

Nota

1 PÁDUA, Santo Antônio de. Sermões Dominicais e Festivos. Tradução de Frei Geraldo Monteiro. Padova: Ed. Messagero, 1979. p. 333. v. 1.

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