O que esperar do Sínodo da Sinodalidade Eclesial?

set 27, 2022Assinante, Igreja em renovação, Outubro 2022, Revistas0 Comentários

Em 1967, São Paulo VI (1897–1978) instituiu o escritório permanente do Sínodo dos Bispos. Esse departamento nasceu como um organismo consultivo da Cúria Romana. Na prática, quando acontece essa reunião entre o papa e o colégio episcopal, em Roma, os bispos do mundo todo são consultados sobre de assuntos específicos. Tudo em vista da prática pastoral.

Na Carta Apostólica Apostolica Sollicitudo1 (que traça as diretrizes desse departamento), pede-se que o Sínodo seja convocado pelo menos a cada dois anos. A ideia é estimular a colegialidade episcopal que, por meio do Concílio Vaticano II (1962-1965), recebeu uma nova configuração. O episcopado transforma-se em sacramento. E, por sua vez, os bispos passam a ser considerados a partir de um tríplice múnus: como sacerdotes, mestres e pastores.

Quando despontou na sacada da Basílica de São Pedro no dia em que foi eleito (13 de março de 2013), o papa Francisco (1936-) apresentou-se à multidão como Bispo de Roma. De acordo com a tradição católica, o sumo pontífice é o líder dessa Igreja local, a qual “preside as demais igrejas na caridade”, segundo a definição de Santo Inácio de Antioquia (30-107).

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A ênfase dada pelo sumo pontífice a esse título naquela ocasião foi uma demonstração de que a colegialidade – que está intimamente ligada à questão da sinodalidade – seria um dos temas-chave do seu pontificado.

Muito embora os papas do Pós-Concílio tenham caminhado nessa direção a partir da convocação de Sínodos e da nomeação de bispos do mundo todo para os antigos pontifícios conselhos, a burocracia e a excessiva centralização da Cúria Romana não permitiam que o espírito do concílio fosse assumido em plenitude. Os bons projetos em prol da sinodalidade se diluíam quando chegavam àqueles departamentos vaticanos repletos de “vícios de corte” e “autopreservação eurocêntrica”. E o papa Francisco tinha consciência de que, sem uma reforma da cúria romana, seria impossível impulsionar a prática sinodal. Portanto, o Sínodo da Sinodalidade, de certa forma, é a grande extensão dessa reforma que ele começou em Roma.

Quando o Santo Padre reuniu um grupo de cardeais para auxiliá-lo na reforma da Cúria Romana assim que assumiu o governo da Igreja, evidenciou que, daquele momento em diante, haveria um esforço para que “tudo o que interessasse a todos fosse tratado por todos”, seguindo a máxima de São Cipriano de Cartago (204-259), o “pai da sinodalidade” na Igreja primitiva. Foi a primeira vez que um pontífice contou com cardeais externos à cúria romana para pôr em prática um projeto de mudança visando o governo central da instituição.

O organismo ganha bastante visibilidade no pontificado do papa Francisco por várias razões. Primeiro, porque sinodalidade é um modus vivendi do cristianismo desde seus primórdios, não uma invenção do atual pontífice, e é por isso que ele a evoca com tanta insistência. Mas no Ocidente, a partir do segundo milênio, essa identidade foi se perdendo. O Oriente manteve essa marca, e o protestantismo, no século XVI, abriu um novo debate em relação a seu modus operandi.

Segundo, o sumo pontífice eleva o status do Sínodo ao transformá-lo em um organismo que não só serve à Igreja “de cima para baixo”, mas é pautado por ela. Nada ficará mais restrito às plenárias episcopais. Na Constituição Episcopalis Communio2, ele formalizou isso, determinando que, a partir de agora, a assembleia sinodal não se restrinja somente às comissões preparatórias e às discussões em Roma, mas conte com o auxílio preliminar de toda a comunidade católica.

Neste trecho, o papa apresenta mais detalhes de como isso funcionaria na prática: “A história da Igreja testemunha amplamente a importância do processo consultivo, para se conhecer o parecer dos Pastores e dos fiéis no que diz respeito ao bem da Igreja. Assim, é de grande importância que, mesmo na preparação das Assembleias sinodais, receba especial atenção a consulta de todas as Igrejas particulares. Nesta primeira fase, os Bispos, seguindo as indicações da Secretaria Geral do Sínodo, submetem as questões, que devem ser tratadas na Assembleia Sinodal, aos Presbíteros, Diáconos e fiéis leigos das suas Igrejas, individualmente ou associados, sem transcurar a valiosa contribuição que pode vir dos Consagrados e das Consagradas […]” (EC, n. 7).

Na Constituição Apostólica Praedicate Evangelium3 (a constituição de reforma da Cúria Romana), ele fez questão de mudar o nome do organismo. O dicastério não se denomina mais “Secretaria do Sínodo dos Bispos”, mas simplesmente “Secretaria do Sínodo”, sinalizando que, no futuro (quem sabe?!), não só os clérigos terão direito de voto. De organismo de “consulta formal pública” o Sínodo transformou-se em uma assembleia mais participativa e, consequentemente, mais fiel às suas origens.

Agora, o que esperar do Sínodo da Sinodalidade? Qual é a intenção do papa Francisco ao convocá-lo? Levar os católicos a reconhecerem-se nele, assumindo a sinodalidade como algo inerente à própria identidade da instituição. Ora, se a Igreja é universal, e é justamente aquilo que a caracteriza, não tem como deixar de ser sinodal.

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