Ao escrever o artigo deste mês, estou pensando em três coisas, a saber:
Em primeiro lugar, que, em uma tarde do mês de setembro de 1967 (coincidentemente um domingo, como neste ano), eu fui ordenado padre na Igreja-Santuário Senhor do Bonfim, no Parque das Nações, em Santo André (SP), pelas mãos do saudoso bispo diocesano dom Jorge Marcos de Oliveira (aliás, o primeiro bispo da Diocese de Santo André). Atualmente, vivo e atuo em Santa Bárbara d´Oeste, no interior de São Paulo, cidade localizada a 160 quilômetros de Santo André, onde nasci, em 1942.

Em 2023, completo 56 anos como sacerdote. Comigo foram ordenados frei Diogo Luís Fuitem e frei Antônio Corniatti. Ressalto que nós três, da classe dos anos 1940, estamos ainda na brecha, servindo o povo de Deus onde a obediência franciscana nos coloca, procurando, em tudo e por tudo, seguir os passos da simplicidade, da fraternidade, da paz e bem de São Francisco de Assis (1182-1226), na Ordem dos Frades Menores Conventuais.

Em segundo lugar, reflito sobre o mês de setembro, que, aqui no Brasil, é inteiramente dedicado à Bíblia: leitura, estudo, reza em comum como fonte de vida cristã. Iniciado lá por terras de Minas Gerais como um “dia da Bíblia”, foi aumentando para uma semana e, mais tarde, para um mês inteiro. Atualmente, é comemorado em 30 de setembro, em homenagem a São Jerônimo (347-420), tradutor para a língua latina, na época, falada pelo povo, por isso chamada de Vulgata (que significa ‘vulgar, popular’). E foi essa a tradução oficial da Igreja, praticamente até o Concílio Vaticano II (1962-1965).

Depois, é claro, nos anos 1950, com a efervescência de novos estudos bíblicos, outras traduções foram surgindo, mais fiéis aos originais hebraico e grego, cujas línguas serviram também como base para São Jerônimo em sua tradução latina Vulgata. O amor à Bíblia do povo católico – há tempos distante e distanciado do Livro Sagrado – ressurgiu de maneira extraordinária, sem dúvida como obra do Espírito Santo, mas também de todos os estudiosos que trouxeram, do mais científico ao mais popular, o Livro Sagrado, novamente, às mãos dos fiéis. Em 2023, todos nós somos convidados a refletir sobre o tema “vestir-se da nova humanidade”, a partir da leitura da Epístola de São Paulo Apóstolo aos Efésios: “Abandonai o homem velho… revesti-vos do homem novo” (Ef 4,22.24).

Em terceiro lugar, entra totalmente em cena nosso caro Santo Antônio de Lisboa e Pádua (1195-1231): fiz meu último ano do curso de Filosofia (além de um ano de estágio) e os quatro anos do curso Teológico na cidade de Pádua, ao norte da Itália, no Instituto Santo Antônio, na célebre Via San Massimo, 25, à sombra por assim dizer das cúpulas da Basílica del Santo (como é conhecido Santo Antônio); os anos eram 1962 a 1967, em pleno Concílio Vaticano II. Esse período foi muito significativo também porque pude conhecer vários bispos latino-americanos e brasileiros que, aproveitando os fins de semana livres, peregrinavam pelos santuários italianos.

Em 16 de janeiro de 1946, o papa Pio XII (1876-1958) declarou Santo Antônio “Doutor da Igreja, Doutor Evangélico” em sua Carta Apostólica, que começa desta forma: “Exulta Lusitania felix, o Felix Padua gaude” [‘Exulta, feliz Portugal! Regozija-te, feliz Pádua’]! É importante mencionar que a obra literária mais importante do santo pregador do Evangelho, sem dúvida, são seus famosos Sermões redigidos em latim (com várias traduções em língua portuguesa), em uma edição típica, publicada pelos frades menores conventuais de Pádua, em 1979.
Em 8 de setembro, comemoramos o nascimento de Nossa Senhora. Destaco que Santo Antônio escreveu seis sermões sobre a Virgem Maria, um dos quais trata justamente sobre sua natividade. Apresento acima a nossos leitores uma tradução diretamente do latim, para que todos possam saborear a mesma fé que iluminava o santo em seu longínquo tempo e lugar.

“A gloriosa Virgem Maria foi qual estrela da manhã entre as nuvens. A estrela da manhã é chamada ‘portadora de luz’ porque brilha mais do que todas as estrelas e, mais exatamente, esplendor, astro. Portadora de luz porque precede o Sol e anuncia o dia, afugenta as trevas da morte com o brilho de sua luz.
Estrela da manhã, portadora de luz é a Virgem Maria, que, nascida na obscuridade da nuvem, dissolve a tenebrosa serração e, para aqueles que estavam nas trevas, na manhã da graça, anunciou o sol da justiça. Com efeito, referindo-se a Maria, o Senhor diz a Jó: ‘És tu que fazes despontar a seu tempo a estrela da manhã’ (Jó 11,17b). Quando chegou o tempo de usar misericórdia, o tempo de construir a casa do Senhor, o tempo favorável e o dia da salvação, aí então o Senhor fez surgir a estrela da manhã, isto é, a Virgem Maria. Para que fosse a luz dos povos. E os povos devem dizer
a Maria aquilo que o povo de Betúlia disse a Judite: ‘O Senhor te abençoou com o seu poder, porque, por meio de ti, arrasou os nossos inimigos. Bendita és tu, filha, diante do Deus altíssimo, mais do que todas mulheres que vivem sobre a terra. Bendito o Senhor que criou o céu e a terra, e te guiou a golpear o chefe dos nossos inimigos. Hoje ele exaltou o teu nome de modo que o teu louvor jamais há de cessar da boca dos homens’ (Jt 13,18-19).
Portanto: a bem-aventurada Virgem Maria, desde o seu nascimento, foi como a estrela da manhã! A bem-aventurada Virgem Maria é comparada à lua cheia porque é perfeita em todos os seus aspectos: ela nunca teve imperfeições, nem em seu nascimento, porque foi santificada ainda no seio materno e guardada pelos anjos; nem durante os dias de sua vida porque nunca pecou de soberba. Sempre brilhou pela plenitude da perfeição. E Maria é luz porque dissolve as trevas” 1.

Foto CaminhandoComSantoAntonio 02 recortesetembro23

ORAÇÃO

“Nós vos pedimos, ó Senhora nossa, já que sois a estrela da manhã: expulsai com o vosso esplendor a nuvem da sugestão diabólica que cobre a terra da nossa alma. Vós que sois qual lua cheia: enchei nosso vazio, dissolvei as trevas dos nossos pecados para que mereçamos alcançar a plenitude da vida eterna e a luz da glória infinita. No-lo conceda Aquele que vos criou para serdes nossa luz, Aquele que hoje vos fez nascer para poder Ele mesmo nascer de vós.
A Ele toda honra e toda glória pelos séculos dos séculos. Amém.”

Nota
1 PÁDUA, Santo Antônio de. Sermões Dominicais e Festivos. Tradução de Frei Geraldo Monteiro. Padova: Ed. Messagero, 1979. p. 106-108. v. II.

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